segunda-feira, 22 de abril de 2013

32

Tem uma coisa que particularmente me incomoda, e nesses tempos, mais que nunca.

É o fato de perguntarem a minha idade e depois da minha pesarosa resposta, me dizerem uma das frases abaixo:
- Ahh, mas você ainda é novinha...
- Iiih é um bebê ainda.
- Ihh ainda tem tempo...
- Ahhh ainda tá no começo.

A pergunta que não quer calar: porque?

Isso me irrita tanto, que estou quase começando a mentir minha idade... pra mais!!! Prazer, Fernanda, 45 anos.

Já respondo sabendo que vou ouvir alguma das pérolas acima, e que obviamente vou perder toda e qualquer credibilidade com a pessoa que me questionou. E pra isso acontecer basta que o inquisidor seja 1 dia mais velho que eu: Ahhh ganhei, nasci no dia 27 de fevereiro de 81 - diz feliz o detetive apontando uma luz forte na minha cara.

Sempre tive cara de criança. Nunca botaram fé em mim - não tô falando da minha capacidade profissional ou inteligência - tô falando é de credibilidade social. Nunca tive.

Quando alguém que não me conhece olha pra mim, deve ver algo como:
Uma criança de 6 anos, que ainda se diverte com canetinhas coloridas, bolsinha emborrachada rosa e meia calça com desenhinhos. Tem as unhas roídas e o cabelo desgranhado. Também devem ver na minha cara que ainda tenho dentes de leite, uma janelinha e vários arranhões nas canelas.

Chego dançando em quase todos os lugares, e desde sempre gente extrovertida e desinibida não parece responsável e profissional. Se você me leva a sério, é porque é tão maluco quanto eu - nem eu me levo!

Tenho concordado mais que nunca com o Pequeno Príncipe:

As pessoas grandes adoram os números. Quando a gente lhes fala de um novo amigo, elas jamais se informam do essencial. Não perguntam nunca: “Qual é o som da sua voz? Quais os brinquedos que prefere? Será que coleciona borboletas?”
Mas perguntam: “Qual é sua idade? Quantos irmãos ele tem? Quanto pesa? Quanto ganha seu pai?” Somente então é que elas julgam conhecê-lo. Se dizemos às pessoas grandes: “Vi uma bela casa de tijolos cor-de-rosa, gerânios na janela, pombas no telhado…” elas não conseguem, de modo nenhum, fazer uma idéia da casa. É preciso dizer-lhes: “Vi uma casa de seiscentos contos”. Então elas exclamam: “Que beleza!”

Esse sabe das coisas, honra a coroa que deveria usar.
Não sei se isso acontece com você, mas detesto quando perguntam a minha idade. A maioria acha que eu detesto porque sou mulher e estou envelhecendo (que lógica!), e até eu explicar...aaaahhh:
"Não amor, eu não quero falar a minha idade porque você vai desdenhar de mim... nem que seja da boca pra dentro!"

Se você observar com cuidado, vai ver que a gente pauta nossas relações, inclusive a medida do nosso poder, de acordo com a idade que o outro tem ou de acordo com quanto ele recebe no holerite todo mês. Bananas por favor, viramos macacos!

Como não gosto que me perguntem a idade, não faço isso com ninguém. Prefiro acreditar que se a pessoa for mais nova ou mais velha que eu, ela veio porque era a única coisa que poderia ter acontecido. É sempre a pessoa certa.

Aos 21 ou 22 conheci um cara que tinha 35 anos. Alguém arrisca dizer o que me disseram na época?
Pra resumir, eu tava sendo "enganada e aproveitada por ele, que lógico, aos 35 não poderia querer nada sério!"
O que diriam se eu me casasse com ele naquela época? Enfim, história pra outro post...
Mas o que diriam da nossa relação quando eu tivesse 72 e ele 85 anos?

Provavelmente nada, porque a essa altura e nessa idade, ninguém mais se importa em subtrair e sim em somar.

Isso me leva a crer que a gente vai aprendendo a deixar de ser besta (que teoria fantástica!).
Quase todos que conheço são péssimos em matemática, mas quando saímos do colégio, parece que começamos a participar de um jogo com a humanidade: procure pelos números e ganhe pontos!

A gente vai deixando isso pra trás porque no fim os números não importam. Na verdade não importam nem no começo, mas no começo somos tolos demais pra admitir que o que vale é o que fulano é.

Eu e você somos mais que um número, e se eu puder defini-lo pela sua data de nascimento, pelo seu RG, verdadeiramente eu não mereço tê-lo conhecido.

Que não perguntem a minha idade e não me revelem as suas, mas me contem sobre suas músicas prediletas. Que não nos avaliem pelo ano em que fomos paridos, mas pelas nossas risadas, histórias e presença.

domingo, 14 de abril de 2013

Canção de amor

Antes de juntar o meu all star lilás com o sapato social preto do Rô, eu tinha muitas dúvidas. Duvidava se o amor seria o mesmo depois de algum tempo, sobre o massacrante teto da rotina... um teto físico, real.

Quando isso aconteceu, todo mundo pensou: Aleluia! Até que enfim... pensei que iam namorar por mais 9 anos!

Mas eu tinha medo. E ele também. Falávamos pouco sobre isso... talvez numa tentativa de não tornar o medo algo real.



E tudo aconteceu sem pressa, formalidades, planejamento ou pedido oficial de casamento.
Casa comigo? Não, tô vendo 'todo mundo odeia o Cris'.

Acho que no nosso caso, pedidos oficiais de casamento não cairiam nada bem.
Não tem a ver com quem somos, com quem fomos ou com quem seremos.

Seria uma piada. Seria excrucitante, como diria minha adorada Clarice Lispector.

Não sei nem imaginar uma cena pra isso. Mas poderia ser algo como, um altar depois de um tapete colorido, talvez parecido com o da parada gay, porque eu gosto é de cor minha gente... uma música de palhaço, e todo mundo dizendo junto, ao mesmo tempo, seus votos de felicidade pra gente, da forma mais informal possível.

Eu entraria vestida de princesa Xena ou de Ariel (com peruca vermelha e tudo).
E ele... bom, pelo que conheço (e amo) estaria vestido de calça social e camisa branca, achando tudo aquilo uma mistura de patético com 'Fernanda'. Acho que riríamos muito.

Daí, que nada disso aconteceu e estamos aqui, num lugar naturalmente 'acontecido'.

Meu medo não passou. E provavelmente o dele também não.
Pensei numa coisa bonita hoje cedo:

Porque a gente tem medo de algo que outros nunca irão conhecer?
Isso além de assustar deveria ser especial! Só nós dois conhecemos os detalhes mais especiais um do outro.

Ninguém sabe mais que ele hoje em dia, como eu fico quando tô com sono ou fome.
Só eu sei e já não me incomodo tanto com o fato de ele gostar de beber café frio.

E as caras que antecipam um ataque histérico de um ou de outro? Só nós conhecemos.

E saber qual é exatamente o sabor do brigadeiro perfeito pra comprar e me dar de presente?
Não como qualquer brigadeiro, não gosto da maioria, e ele sempre come os restos depois da minha primeira mordida, quando me decepciono com o gosto.

Com quem mais eu poderia fazer um acordo silencioso de 'você lava a louça e eu a roupa'. Tá na cara que não dá pra manchar um copo, mas uma camisa sem dúvida... então deixa comigo (que eu mesma mancho, haaaa!).

E sobre a pressa de chegar, de sair, de voltar ou de ficar? Nem todo mundo conhece.

E dá-lhe Renato Russo...

Ele pra mim:
Gosto de ver você dormir
Que nem criança com a boca aberta

Ele pra ele:
Agora que temos nossa casa
é a chave que sempre esqueço

E eu, canto todas as partes, porque nasci pra cantar!

Hoje fiquei pensando que o que eu mais gosto atualmente, é o fato de não ter que explicar quem eu sou. Eu sou um dicionário já lido ou um manual já estudado nas horas de pane.

Muitas vezes, com pessoas que acabo de conhecer, o que acho mais trabalhoso é ter que explicar quem eu sou. Não tô falando de explicar do que gosto, o que faço, que músicas ouço. Isso não define quem eu sou. Tô falando das caras, bocas, silêncios, barulhos, cantorias, dancinhas, imitações, ausências e presenças - isso me define.

E pra isso é preciso tempo. Então, voltando ao começo, talvez tenhamos tido medo por termos tido muito tempo... são 9 anos minha gente! Dá pra dizer então, que eu tenho mais medo daquilo que conheço, do que do que desconheço - é bem a minha cara! E acho que a dele também.

A gente sabe quem é. E por isso todo o medo. Que bonito.

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Um São Sebastião de massinha

Lembra quando você fazia um desenho bem bonito na escola e dava pra alguém que amava? Bem bonito é forma de dizer, você pintava a vaca de verde, a nuvem de laranja e fora do contorno (e não entendo porque não pode). 

Lembra de quando você fazia um boneco ou um cachorro de massinha, com as cores todas misturadas de preferência, deixava secar e dava pra sua vó?

Lembra de quando você fazia um cartão lindo (de viver, como diria a Hebe) pro dias das mães, cheio de brocal, lantejoulas, gliter e palitinhos de sorvetes que você guardou durante um mês porque a professora pediu? Aí no dia das mães, você com brilho até o rim, ia cheio de entusiasmo entregar o cartão: mãaaae, eu que fiz!

Se lembra disso tudo, deve lembrar de quando ia brincar na rua depois da escola com todo mundo que aparecia e até com os amigos imaginários. Você se esborrachava, se ralava inteiro e voltava cheio de hematoma, mas não se importava se era porque alguém sem querer te empurrou de cara pro muro durante o jogo de queimada. Aposto também que você não sabe hoje, e talvez nem na hora, quais eram as cores ou a idade de cada um. Ou se o cabeludo era na verdade uma menina, e se a menina de cabeça raspada era na verdade um menino. Piolho? Raspa!

Aaah, tem outra coisa. Se lembra quando no colégio você podia levar o seu brinquedo predileto em um determinado dia da semana? Nunca lembro o que levei, mas sei que levei. Ao chegar o tão esperado dia dos brinquedos, você não se importava em trocar com seus amigos. Seu brinquedo estava em boas (e pequenas) mãos.

Lembra também da hora do soninho no colégio? Com isso, você e eu aprendemos a confiar. A confiar que estaríamos protegidos ao fecharmos os olhos num lugar que não era a nossa casa e que certamente tinha mais de dois adultos. Aprendemos a confiar e a esperar que quando acordássemos, alguém amoroso teria preparado um lanchinho gostoso.

Lembra quando você aprendeu a andar de bicicleta? Alguém te segurou até você receber um recadinho de Deus dizendo que você sem dúvida, já podia tirar as rodinhas. Nessa hora, você só queria que alguém que você confiasse e que não mentisse pra você (falando que está segurando a garupa sem estar) soltasse muito lentamente a bicicleta, de preferência numa ladeira, pra você também já se gabar de ter aprendido "sozinho" a andar de "bike".

Existem muitos outros aprendizados que levaremos delicadamente conosco até podermos repassar.
No entanto, em todos esses, existe uma coisa em comum, além do fato de você na época ser criança: você estava aprendendo a aprender.

E tem me parecido que agora é a minha hora de voltar a aprender como aprender. E talvez seja a sua hora também.

Não sei, mais deve ter sido ontem que as coisas mudaram e não percebi. Ontem não tínhamos preconceito. Hoje temos um monte. Aprendendo a aprender: isso não nasceu e nem veio de você.

Você foi pra escola, pra casa sua e da vó e aprendeu que tudo bem pintar desenhos de cor diferente das que vemos - se aquilo é só papel e não existe mesmo, é uma boa ocasião pra acessar seus desejos. Aprendeu que misturar é legal, e que o boneco de massinha vai entender bem o fato de'le ter a cara meio marrom com pintas azuis e as pernas vermelhas com laranja.

Aprendeu também que "mais ainda é pouco", e que você poderia ter colocado mais gliter, mais brocal, mais lantejoulhas e mais palitos no cartão de dia das mães. Misturar é mesmo muito inteligente.

Aprendeu que na escola com seus brinquedos ou na rua com os amigos reais ou imaginários, o importante é compartilhar, e não segregar, separar, dividir, questionar ou classificar.

Aprendeu a confiar no outro, seja na hora do soninho ou ao aprender (sozinho) a andar de bicicleta. Quem estava lá? Não importa. Certamente alguém que te amava.

Passamos anos na infância. Anos naqueles anos. Algumas pessoas que conheço estão neles até hoje.
E porque será que não aprendemos ou que esquecemos que as escolhas amorosas do outro são tão genuínas e legítimas hoje quanto as suas quando criança?
Porque você escolhia misturar as massinhas vermelha e marrom? Tecnicamente não combina.

Então o que penso agora e acho que sempre pensei, é que todo mundo que passou por esses aprendizados e escolhas, pode "aprender a aprender a entender" que menina com menina e menino com menino dá a mesma soma que menina com menino.

Acho que gosto de São Paulo, gosto de São João, gosto de São Francisco e de São Sebastião. E eu gosto de meninos e meninas. Viva "a" legião urbana que se faz feliz. Viva a Daniela Mercury que trocou alianças.

Se vira com isso: você aprendeu lá atrás, que misturar, fugir do contorno, usar mais recursos coloridos é fantástico! Porque quer esquecer disso?

Eu nessa estrada pequenininha me sinto com o pulmão cheio de ar poderoso e potente, sempre que escuto que alguém teve a coragem (construída ou emprestada) ou a delicadeza de compartilhar com o mundo que quem segura a sua mão na maior parte do tempo é São Paulo, São João, São Francisco, São Sebastião, é menino ou menina. Tanto faz. Porque amor... tanto faz, desde que venha e vá, desde que circule.